quarta-feira, 16 de abril de 2008

Uma Vida Inteira (And he knew it was love...)


Ao passar a mão em seus cabelos bagunçados, ele concretiza em seu olhar o oceano inteiro em uma única gota de saudade. O mar em seus olhos acolhe e dissipa dissimuladamente as saudades que virão quando o futuro pressentido chegar. Sente saudade daquele mesmo momento, delicadamente observado de uma bicicleta parada na areia. Nunca soubera por em palavras tal evento, mas era puramente saudade. Uma saudade afinada, em tom menor, daquilo que estava acontecendo. Saudade de tudo aquilo que ele nem havia vivido.

Tinha a certeza da veracidade do estranho sentimento, pois sentia algo maior por vir. Ouvia a grandiosidade do poder de sonhar, sentindo assim, antecipadamente, saudade das águas obedientes à lua crescente, existentes apenas ali, no seu mundo isolado e simples. Já sentia saudade de qualquer noite de segunda-feira de maio. Noites em que estava sozinho em casa, dançando canções que somente a ele pertenciam. Noites com cheiro de cravo e canela, em páginas borradas de deveres mal feitos e sonhos. Sim, sonhos! Com sonhos, quem precisaria de deveres? Sempre falaria isso em alto e bom tom, rindo de sua própria falta de sensibilidade em relação ao que não lhe interessava.

Seus simples gestos diante do hibridismo daquele estranho sentimento era um ritual diário: bicicleta, praia, lua e vento. O enlace que unia passado, presente e futuro se dava em tais momentos, os tornando pequenas dádivas que portavam o título de verdadeiros milagres secretos. Ficaria horas imaginando como cada alegria realizada no futuro viajava no tempo e o atingia lá no passado – para ele, presente – fazendo-o sentir uma felicidade inexplicável.

Tentava decifrar que alegrias futuras transitavam assim, da frente pra trás. E perdia-se nas horas tentando saber se escapavam do futuro para o passado por serem alegrias grandes de mais para caber em um tempo só. Poderiam ser beijos correspondidos, sorrisos doces ou simplesmente abraços apertados. Tão inexplicável, mas até certo ponto, pois ele sabia que tudo isso era amor. Era uma flor nascendo em meio às pedras! Tais alegrias misteriosas eram os olhos de anjos confidentes! Eram o prenúncio de sonhos realizados em um futuro não vivido e muito menos especificado! Então, ao sorrir, inexplicavelmente ele sabia que quem se colocava por trás de tudo, quem permanecia até o fim, era o amor... Tão além do que ele poderia compreender, mas era o amor... E foi assim que ele sorriu e percebeu os sons do tempo.

Quando ele passa a mão nos cabelos bagunçados, de frente para o mar, lá no passado, ele está no futuro vendo um mundo que existe além da porção de terra ocupada por ele. Seus dedos atravessam seus cabelos para tocar o rosto do amigo que ainda não entrara em sua vida; Seus dedos tocam as cordas que ainda nem sequer foram pensadas por suas mãos pálidas de noite de outono e seu coração, perplexo e gelado, chora a partida daquele que antes mesmo de chegar já foi embora. Laços do tempo transformando-se em indecifráveis nós dentro do coração humano. Ele sabia que era o amor vencendo o tempo.

Mas com sonhos, quem precisaria de tempo? Pensa ele no futuro - para ele, presente - ao digitar este texto.

Sabe então que o amor é tudo o que ele pode compreender.

2 comentários:

Nóia disse...

Muito bom. Gostei bastante. Aliás, enquanto eu lia o texto, várias frases me deram uma impressão de familiaridade, como se eu já tivesse visto isso em algum lugar. Anyways, é um texto bem seu, nem precisaria da sua assinatura.

=]

Carlos Jannarelli disse...

Nossa, foi difícil de ler até o ponto que tentava usar uma lógica temporal linear. Hahahaha!

Depois fui entendendo a idéia.
Não posso me identificar mais com este texto. Afinal, não acredito no tempo. :)

E não posso concordar mais sobre a moral da história. O Amor é o Uno em nós. Não há tempo e não há espaço. Só o sentimento que leva ao movimento. :)

Tá bom, agora acho que quem ler isso vai achar que eu estava doidão... Hahahahaha!