"Come away, O human child!
To the waters and the wild
With a faery, hand in hand,
For the world's more full of weeping than you can understand."
To the waters and the wild
With a faery, hand in hand,
For the world's more full of weeping than you can understand."
The Stolen Child - W.B. Yeats
O quarto era rústico. Apesar de abrigar móveis antiqüíssimos feitos da madeira mais fina da região, o conjunto todo trazia uma simplicidade admirável. Diante das etéreas auras das crianças, tal aposento lembrava um deserto escuro e frio. Tão vasto... Muito fácil seria se perder dentre seus mistérios! Embora tivesse em suas antigas paredes muitos quadros e imagens sedutoras, apenas o imponente espelho, no canto do aposento, dava alguma vida ao lugar. Fora um presente anônimo, dado junto com as crianças, ao serem abandonadas na porta de dois estranhos. Tinha em sua moldura pequenos rostos e pequenas asas, todas ornamentadas com flores e pedras preciosas das mais diferentes cores. Era enorme e parecia um portal. Isso! Um portal! Exclamava Nanna ao examinar o antigo espelho, quase hipnotizada pela sua própria imagem. Em doze primaveras de vida, e com um sinal esverdeado entre seus cabelos vermelhos, carinhosamente chamado de “beijo de fada”, nunca tivera tanta certeza de não pertencer aquele lugar. Simplesmente não conseguia - Se é que tentava - esconder sua misteriosa origem. Todos os seus gestos impediam que tal verdade fosse escondida. Cada movimento revelava sua não-existência àquela vida.
- Não creio em ti, da ra ra... Não creio em ti! Cantarolava Midir, o irmão mais novo, ao se preparar para deitar ao lado da querida irmã. Em dez invernos de vida, o menino tentava como ninguém esconder seus mais íntimos sentimentos e sua profunda fé nas palavras daquela que amava como uma mãe. A sabedoria implícita que emanava da boca de Nanna o apavorava, pois a sabedoria está diretamente ligada à verdade. E esta, até então, sempre doera. Nanna falava de forma doce, mas com traços escuros de quem não poderia esconder uma certa angústia. Falava com os olhos fixos no nada, e suas palavras, dizendo mais do que ela em si poderia dizer, se espalhavam por todo o quarto como vapor:
- “Cantam aos pés de meus ouvidos. Ah, que doces são aquelas vozes... Hão-de cantar para sua alma também. E hão-de ornamentar com flores seus cabelos, Midir... Espere e verás, querido irmão!”
Deitados de mãos dadas em meio à seda branca da cama, ambos sabiam em seus corações o que os esperava. Tentavam dormir com uma certeza velada pelas paredes daquele quarto de onde as únicas saídas para um mundo melhor eram a janela e o espelho. A porta, não. A porta para o mundo cruel de seus pais adotivos, jamais. Por hora só queriam dormir. Queriam sonhar para sempre.
No alto daquela mesma noite, pequenas risadas se fizeram ouvir de longe. Vinham do âmago silencioso do luar, que tentava sem sucesso os envolver em sono. As risadas vinham com o vento que tentava abrir a janela, e vinham com um ritmo certo em misteriosa melodia. Seriam sonhos? Sim! Seriam! Sonhos que vinham pelo ar para levá-los embora dali.
- É chegada a hora, irmão. Sussurrou Nanna, pegando Midir pela mão ao ouvir seus visitantes. Passo a passo, ambos caminharam até a janela. Primeiramente, um passo em nome da vida da qual foram privados por anos. Logo em seguida, outro passo, este em nome da liberdade prestes a ser alcançada. Em profunda paz deram passos em direção ao eterno até serem supreendidos por um estrondo que, com um intenso golpe de ar, abriu brutalmente a janela, lançando algo em direção ao antigo espelho. Os distantes risos se fizeram mais altos e mais intensos, e ao som dos pequeninos visitantes os irmãos viram repousar no chão do quarto um pequeno ramo de campânulas cor-de-rosa. Instantaneamente sabiam do que se tratava tal presente dado por aqueles pequenos deuses caídos, que em pequena algazarra cantavam:
- “Comam o número correto e nosso reino diante de seus olhos se abrirá! Comam além ou aquém do esperado, e suas doces almas hão-de ficar para sempre seladas no silêncio!"
- Não creio em ti, da ra ra... Não creio em ti! Cantarolava Midir, o irmão mais novo, ao se preparar para deitar ao lado da querida irmã. Em dez invernos de vida, o menino tentava como ninguém esconder seus mais íntimos sentimentos e sua profunda fé nas palavras daquela que amava como uma mãe. A sabedoria implícita que emanava da boca de Nanna o apavorava, pois a sabedoria está diretamente ligada à verdade. E esta, até então, sempre doera. Nanna falava de forma doce, mas com traços escuros de quem não poderia esconder uma certa angústia. Falava com os olhos fixos no nada, e suas palavras, dizendo mais do que ela em si poderia dizer, se espalhavam por todo o quarto como vapor:
- “Cantam aos pés de meus ouvidos. Ah, que doces são aquelas vozes... Hão-de cantar para sua alma também. E hão-de ornamentar com flores seus cabelos, Midir... Espere e verás, querido irmão!”
Deitados de mãos dadas em meio à seda branca da cama, ambos sabiam em seus corações o que os esperava. Tentavam dormir com uma certeza velada pelas paredes daquele quarto de onde as únicas saídas para um mundo melhor eram a janela e o espelho. A porta, não. A porta para o mundo cruel de seus pais adotivos, jamais. Por hora só queriam dormir. Queriam sonhar para sempre.
No alto daquela mesma noite, pequenas risadas se fizeram ouvir de longe. Vinham do âmago silencioso do luar, que tentava sem sucesso os envolver em sono. As risadas vinham com o vento que tentava abrir a janela, e vinham com um ritmo certo em misteriosa melodia. Seriam sonhos? Sim! Seriam! Sonhos que vinham pelo ar para levá-los embora dali.
- É chegada a hora, irmão. Sussurrou Nanna, pegando Midir pela mão ao ouvir seus visitantes. Passo a passo, ambos caminharam até a janela. Primeiramente, um passo em nome da vida da qual foram privados por anos. Logo em seguida, outro passo, este em nome da liberdade prestes a ser alcançada. Em profunda paz deram passos em direção ao eterno até serem supreendidos por um estrondo que, com um intenso golpe de ar, abriu brutalmente a janela, lançando algo em direção ao antigo espelho. Os distantes risos se fizeram mais altos e mais intensos, e ao som dos pequeninos visitantes os irmãos viram repousar no chão do quarto um pequeno ramo de campânulas cor-de-rosa. Instantaneamente sabiam do que se tratava tal presente dado por aqueles pequenos deuses caídos, que em pequena algazarra cantavam:
- “Comam o número correto e nosso reino diante de seus olhos se abrirá! Comam além ou aquém do esperado, e suas doces almas hão-de ficar para sempre seladas no silêncio!"
De mãos dadas e de olhos fechados, Nanna e Midir dividiram e mastigaram as campânulas em um delicado ritual. Trasnbordavam em euforia, rodopiando pelo quarto acompanhados pelos pequeninos em uma festa caleidoscópica e colorida. Eu acredito, eu acredito, eu acredito! Exclamavam em uma descontrolada fúria enquanto dançavam intensamente no ritmo da liberdade alcançada. Eu acredito, eu acredito, eu acredito! Gritavam sem qualquer limite em um círculo intenso, envolvidos no êxtase da liberdade secreta trazida pelos seus visitantes. As campânulas dobravam sinistramente guiando aqueles que outrora foram arrancados de um lar digno de sua pureza. Assim, naquela mesma noite, ambos os irmãos deixaram para trás aquela vida, e perderam-se por entre pétalas cor-de-rosa, permanecendo envolvidos na magia das campânulas até despertarem em um mundo no qual eram, como há muito sabiam, Príncipe e Princesa.