sábado, 2 de agosto de 2008

Onírico II

"Hear my silent prayers
Heed my quiet call
When the dark and blue surround you
Step into my sigh
Look inside the light
You will know that I have found you"
- Dreamcatcher, Secret Garden -

A idéia de realizar o menor movimento para levantar-me soava como um esforço hercúleo. Pedaços de silêncio e sono, mesclados, penduravam-se delicadamente nos detalhes de meu quarto.

Imerso na penumbra tentei chamar sem sucesso por meu irmão, que dormia na cama ao lado. A sensação de acolhimento que a sonolência provia agora parecia desfazer-se. Não conseguia pronunciar absolutamente nada e, muito menos, sentia minha respiração fluir. Tal quadro me pareceu muito grave, me preocupando ao extremo. O sono já havia se dissipado e agora eu tentava – ainda sem sucesso algum – levantar-me para buscar ajuda. Foi então que notei as formas peculiares que estavam diante de mim.

Pude reparar nas silhuetas daquilo que pareciam ser duas meninas por volta de seus treze ou quatorze anos. Não conseguia distinguir, em meio à penumbra, as cores de seus cabelos longos ou de seus vestidos. Eram sombras sentadas aos pés de minha cama, aterrorizando-me a cada vez em que eu tentava chamá-las a atenção em vão. Pareciam procurar algo, ou simplesmente conversavam. Trocavam confissões, talvez... Eu tentava gritar. Eu queria sentir-me livre, tentando aplicar uma força verdadeiramente descomunal para mover um dedo que fosse.

Parei em choque quando, para meu desespero, notei aquilo que parecia estar me olhando de cima. Esta terceira figura – também ela uma sombra - se tratava de uma figura masculina, que por sua vez se encontrava por trás do espelho de minha cama. Minha voz soava distante, como se eu estivesse dentro d’água. Meus gritos perdiam-se em meio a um estranho silêncio, sendo o único som nítido uma ofegante respiração que parecia alternar-se entre meus ouvidos, indo freneticamente da direita para a esquerda, da esquerda para a direita. Sentia como se algo me segurasse, prendendo-me àquela cama e àquele quarto, forçando-me a ver as três criaturas que me acompanhavam.

Ao não mais suportar aquilo, me rendi; e desistindo de gritar ou de chamar por qualquer ajuda, finamente me movi, correndo em lágrimas para o quarto de meus pais. Acordei-os afirmando com angústia que algo se encontrava em meu quarto. Contudo, eu sabia secretamente, bem no fundo, que além de meu irmão nada havia lá. Disfarcei as verdadeiras raízes de minha angústia, que não passava de uma triste frustração.

Eu havia pela primeira vez despertado em um mundo que não era o meu e mal o explorara por conta de minhas tolas inseguranças. Assim, o medo e a aflição perdiam suas cores à medida em que eu me embalava na possibilidade de ter finalmente encontrado as fadas com as quais sempre sonhei. Seres que talvez me guardassem, trocando segredos aos pés de minha cama.